quarta-feira, 29 de julho de 2009




Seguras o tempo nos fios do sol

No canto do galo

Na luz da manhã

Nas nervuras das folhas recortadas de azul


Misturas no sangue a doçura sofrida

De lágrimas gritos

De êxtases beijos

Silêncios murmúrios

Palavras na pele à flor da brisa


terça-feira, 28 de julho de 2009




segunda-feira, 27 de julho de 2009


Um dia, no limite do tempo

as promessas virão em cortejo

com grinaldas e cânticos

em explosão de luz e perfeitas






If you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you;

If you can trust yourself when all men doubt you,

But make allowance for their doubting too;

If you can wait and not be tired by waiting,

Or, being lied about, don't deal in lies,

Or, being hated, don't give way to hating,

And yet don't look too good, nor talk too wise;

If you can dream - and not make dreams your master;
If you can think - and not make thoughts your aim;

If you can meet with triumph and disaster

And treat those two imposters just the same;

If you can bear to hear the truth you've spoken

Twisted by knaves to make a trap for fools,

Or watch the things you gave your life to broken,

And stoop and build 'em up with wornout tools;

If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,

And lose, and start again at your beginnings

And never breath a word about your loss;

If you can force your heart and nerve and sinew

To serve your turn long after they are gone,

And so hold on when there is nothing in you

Except the Will which says to them: "Hold on";

If you can talk with crowds and keep your virtue,

Or walk with kings - nor lose the common touch;

If neither foes nor loving friends can hurt you;

If all men count with you, but none too much;

If you can fill the unforgiving minute

With sixty seconds' worth of distance run -

Yours is the Earth and everything that's in it,

And - which is more - you'll be a Man my son!


Rudyard Kipling


domingo, 26 de julho de 2009





Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração.

António Ramos Rosa

sábado, 25 de julho de 2009





Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, 24 de julho de 2009




Senhora, partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.


Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tam tristes os tristes,
tam fora d’esperar bem
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.


João Roiz de Castelo-Branco


quinta-feira, 23 de julho de 2009





Desejei-te pinheiro à beira-mar
Para fixar o teu perfil exacto.

Desejei-te encerrada num retrato
Para poder-te contemplar.

Desejei que tu fosses sombra e folhas
No limite sereno dessa praia.

E desejei: "Que nada me distraia
dos horizontes que tu olhas!"

Mas frágil e humano grão de areia
Não me detive à tua sombra esguia.

(Insatisfeito, um corpo rodopia
na solidão que te rodeia)

David Mourão Ferreira


quarta-feira, 22 de julho de 2009





Pescador da barca bela,
Onde vais pescar com ela.
Que é tão bela,
Oh pescador?


Não vês que a última estrela
No céu nublado se vela?
Colhe a vela,
Oh pescador!


Deita o lanço com cautela,
Que a sereia canta bela...
Mas cautela,
Oh pescador!


Não se enrede a rede nela,
Que perdido é remo e vela
Só de vê-la,
Oh pescador.


Pescador da barca bela,
Inda é tempo, foge dela
Foge dela
Oh pescador!


Almeida Garrett






Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexamdre O'Neil

terça-feira, 21 de julho de 2009





"Ó não me fujas! Assim nunca o breve
Tempo fuja de tua formosura!
Que, só com refrear o passo leve,
Vencerás da fortuna a força dura.
Que Imperador, que exército se atreve
A quebrantar a fúria da ventura,
Que, em quanto desejei, me vai seguindo,
O que tu só farás não me fugindo!

"Pões-te da parte da desdita minha?
Fraqueza é dar ajuda ao mais potente.
Levas-me um coração, que livre tinha?
Solta-me, e correrás mais levemente.
Não te carrega essa alma tão mesquinha,
Que nesses fios de ouro reluzente
Atada levas? Ou, depois de presa,
Lhe mudaste a ventura, e menos pesa?

"Nesta esperança só te vou seguindo:
Que, ou tu não sofrerás o peso dela,
Ou na virtude de teu gesto lindo
Lhe mudarás a triste e dura estrela:
E se se lhe mudar, não vás fugindo,
Que Amor te ferirá, gentil donzela,
E tu me esperarás, se Amor te fere:
E se me esperas, não há mais que espere."

Já não fugia a bela Ninfa, tanto
Por se dar cara ao triste que a seguia,
Como por ir ouvindo o doce canto,
As namoradas mágoas que dizia.
Volvendo o rosto já sereno e santo,
Toda banhada em riso e alegria,
Cair se deixa aos pés do vencedor,
Que todo se desfaz em puro amor.

Ó que famintos beijos na floresta,
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves, que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã, e na sesta,
Que Vénus com prazeres inflamava,
Melhor é experimentá-lo que julgá-lo,
Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.

Luís de Camões


domingo, 19 de julho de 2009





Ouves, meu amor, a água que brotou

No côncavo da pedra que a tua mão marcou?


Ouves, meu amor, o passo do veado

Correndo no caminho que só por nós pisado?


Entendes, meu amor, a voz que fala agora

Do tempo que esperou, da lenta e só demora?


Já era onde nós somos a nossa paz presente.

Só nós entrámos nela e a agora é que se sente.


Alumiam-se as noites, Deméter aparece,

Tu sentas-te a meu lado e o trigo reverdece.


Pedro Tamen


sábado, 18 de julho de 2009





Por ti

cruzo os céus

e sigo o voo das gaivotas

Ascendo aos espaços siderais

e confundo-me no brilho das estrelas


Para ti

solto o grito

e anuncio a imensa liberdade

Penetro o universo infinito de beleza

e percorro o êxtase da eternidade


sexta-feira, 17 de julho de 2009





As palavras são línguas a penetrar
na boca fechada. Sempre te quis dizer
o que no teu calar não dizes.
Apenas repetes: homem de pouca fé.
Apenas corrijo: homem que precisa
de fé reavivada. Fogo e vento
enlaçam-se nas ardências mudas
enquanto sorvo o mel que o teu alastrado corpo
derrama. Homem de pouca fé. Terás razão.

Mas agora, finalmente, ouso-me
no âmago lento e na espessura do equívoco
corto veias rubras pulsando no bafo
que paralisa o suor da folhagem.

Foi tanta, tanta, a ousadia
deste homem de pouca fé.
Foi tanto, tanto o mistério devassado.
Foi um rio cheio, com precipícios, sedes, tumultos.
Foi tudo: o vendaval e as lágrimas
de um homem de pouca fé.

E agora, longe, longe,
nada é.

Fernando Namora

quinta-feira, 16 de julho de 2009





Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança;

Todo o Mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.


Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança;

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem, se algum houve, as saudades.


O tempo cobre o chão de verde manto,

Que já coberto foi de neve fria,

E em mim converte em choro o doce canto.


E, afora este mudar-se cada dia,

Outra mudança faz de mor espanto:

Que não se muda já como soía.


Luís de Camões